Unidade 3.3 - Aspectos Legais e Consequências Jurídicas

Unidade 3.3

Parte 1

 Videoaula: Aspectos legais da exposição sexual de crianças e adolescentes na Internet 2:44 min


A prática de compartilhamento dos nudes e as situações de violência associadas a ela possuem diferentes abordagens dependendo da idade e do contexto dos envolvidos. Nos casos em que envolvem vazamento ou compartilhamento não consentido de imagens de pessoas menores de 18 anos, as repercussões jurídicas são específicas e mais rigorosas. A publicação não autorizada de conteúdos íntimos de adultos também gera consequências legais sérias e por isso é importante conhecer alguns marcos legais que podem amparar as nossas ações preventivas e de orientação às vítimas. Assim como tratamos dos casos de Cyberbullying, no que diz respeito à sexualidade de crianças e adolescentes vale destacar a noção de proteção integral aos direitos humanos conforme estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescentes no Brasil (E.C.A) e na Convenção Internacional dos Direitos das Crianças das Nações Unidas.
A produção e troca voluntária e consentida de conteúdo íntimo, como vimos, precisa ser encarada como parte das experiências iniciais de adolescentes e o foco pode estar na conscientização para escolhas responsáveis e seguras, antes de criminalizar as condutas. Os casos de vazamento ou qualquer troca que envolva chantagem, ameaça, assédio ou aliciamento passam a ter relação com formas de violência sexual e, dependendo da idade dos envolvidos, as consequências jurídicas são diferentes.
Fonte: AVA - SED/SC.

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Parte 2

Para que possamos ter o detalhamento de pontos apresentados no vídeo, destacamos abaixo algumas leis que precisam ser conhecidas para diferenciarmos as situações. Vamos começar pela abordagem mais geral de direitos e deveres prevista no ECA.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é um conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que tem o objetivo de proteger a integridade da criança e do adolescente, aplicando as diretrizes da Declaração dos Direitos Humanos. O ECA foi instituído pela Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 e representa um avanço no direito das pessoas ao explicitar os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta, já previstos na Constituição Federal de 1988, que elevou a criança e o adolescente à preocupação central da sociedade.
Para os efeitos dessa Lei, criança é a pessoa de até doze anos de idade incompletos. Já o adolescente é a pessoa que possui de doze a dezoito. O ECA segue a essência universal de orientações assumidas por diversas nações em todo o mundo, com base em documentos internacionais, como a Declaração dos Direitos da Criança, as Regras Mínimas das Nações Unidas para Administração da Justiça da Infância e da Juventude (Regras de Beijin - Resolução 40/33 - ONU 29/11/1985) e as Diretrizes das Nações Unidas para Prevenção da Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad - ONU 1/03/1988). Seu uso e divulgação são fundamentais para efetivar a política de proteção integral adotada pelo Estado brasileiro que deve ser garantida por todos nós.
  •  Art. 5
    Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

  • Art. 15
    A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

  • Art. 16
    O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
    a) ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
    b) opinião e expressão;
    c) crença e culto religioso;
    d) brincar, praticar esportes e divertir-se;
    e) participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
    f) participar da vida política, na forma da lei;
    g) buscar refúgio, auxílio e orientação.
Comentários:
Os dispositivos presentes no ECA devem ser promovidos e difundidos também na Internet, espaço público de interação entre as pessoas, no qual TODOS os direitos e deveres devem ser garantidos. As crianças e adolescentes têm direito a se informar, a se divertir, interagir e brincar no mundo digital, devendo toda sua singularidade de pessoa em desenvolvimento também ser preservada na Internet. Por isso, precisamos orientá-las para um uso seguro e saudável da Internet, oferecendo condições suficientes para prevenir e garantir a proteção integral daquelas que podem ser vítimas de cibercrimes, mas sem privá-las de suas liberdades. O desafio nos casos de nudes e da prática de sexting é definir os limites dessas liberdades sexuais em cada faixa etária, principalmente pelo fato de não podermos simplesmente considerar as idades como marcos definitivos para as questões de maturidade, discernimento e capacidade crítica para boas escolhas nas expressões e publicações on-line.
  •  Art. 17
    O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais
    I- ataques físicos;

  • Art. 18
    É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor;


Texto integral da Lei
Comentários:
Ao pensar em casos de vazamento de nudes, temos clareza de que essas exposições indesejadas violam a dignidade e mesmo a integridade psíquica, pois as humilhações podem ter impacto muito danoso na imagem e na formação das identidades.
Fonte: AVA - SED/SC.

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Parte 3

Dessa forma, as escolas e educadores fazem parte do conjunto de atores da sociedade que precisam atuar na proteção e zelo para que os alunos estejam a salvo de tratamentos vexatórios e constrangedores também na Internet. Assim como precisamos diferenciar as brincadeiras das violências para enfrentar o Cyberbullying, precisamos diferenciar as práticas consentidas de troca de nudes das situações de ameaça e intimidação que podem ocorrer tanto entre pares quanto por meio de um adulto mal intencionado que se aproveita da imaturidade de crianças e adolescentes para solicitar imagens íntimas ou mesmo iniciar conversas sexuais pelas redes sociais ou aplicativos de mensagem. Um dos dispositivos do ECA estabelece que o acesso à informação e conteúdos precisa respeitar a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento das crianças e adolescentes. Ainda que tenhamos algumas classificações indicativas para os conteúdos de jogos, aplicativos e redes sociais, o conteúdo digital é muito dinâmico. Cada usuário, incluindo os menores de 18 anos, pode criar seus próprios conteúdos e compartilhar na grande rede em escala global.
  •  Art. 71
    A criança e o adolescente têm direito à informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

  • Texto integral da Lei
Comentários:
Novamente temos um desafio que não é jurídico nem técnico, mas educacional. Educação para amadurecimento e capacidade de autocuidado na publicação de informações pessoais, e maturidade para lidar com os conteúdos dos outros. Discernimento para reconhecer conteúdos impróprios ou agressivos e, o mais importante, referências de adultos de confiança para poder receber apoio e orientação quando se enfrentam situações de incômodo ou dúvidas. No que diz respeito aos sites e conteúdos pornográficos on-line, sabemos que as opções de restrição são facilmente burladas quando os próprios usuários devem sinalizar sua idade. Pensando nos aplicativos de mensagens, que permitem ampla circulação de fotos e vídeos, tudo fica ainda mais complicado quando o assunto é restringir acesso a conteúdos impróprios para menores de 18 anos.

Alerta


Para as situações de produção e distribuição de conteúdo íntimo que envolvam nudes ou qualquer representação sexual de crianças ou adolescentes, o ECA tem artigos específicos que definem a pornografia infantil como um crime contra a dignidade de crianças e adolescentes. A partir de 25 de Novembro de 2008, os artigos 240 e 241 passaram a incluir novas formas de abuso e exploração sexual por meio da Internet, aumentando a pena e criminalizando novas práticas. Confira os artigos específicos:

  •  Art. 240
    Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

  • Art. 241
    Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

  • Art. 241-A
    Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
    Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

  • Art. 241-B
    Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
    Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

  • Art. 241-C
    Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:
    Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

    Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.

  • Art. 241-D
    Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:
    Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

  • Art. 241-E
    Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais.


Texto integral da Lei
Comentários:
Pelo texto estabelecido no Art. 241-E, os nudes produzidos pelos adolescentes, ainda que consentidos e numa relação de confiança, são materiais que não podem circular na rede, pois seu envio, posse ou produção podem ser caracterizados como distribuição, posse e produção de pornografia infantil. As autoridades já vêm trabalhando há muitos anos para enfrentar a circulação criminosa desses conteúdos que eram produzidos por agressores sexuais, mas atualmente um volume expressivo desses conteúdos íntimos envolvendo adolescentes circula nas redes nas conversas entre pares. Muitos juízes da infância insistem na necessidade de educação e prevenção, ao lado de ações da justiça restaurativa para lidar com as situações que são notificadas, de acordo com o tipo de dano produzido.
Quando há exposição não consentida, os adolescentes que registram, divulgam ou possuem esses materiais íntimos em seus aparelhos estão cometendo o ato infracional equivalente aos crimes acima indicados. O cenário é complexo nas produções e trocas consentidas, mesmo nas que não geram danos, pois no exercício de sua liberdade sexual os adolescentes acabam violando as previsões legais do ECA, ainda que tenham feito as imagens de si mesmos sem constrangimento ou ameaça. Nesses casos, a principal estratégia é mesmo a conscientização sobre os riscos desse tipo de prática.
Nas situações de vazamento, além de o ECA prever o ato infracional para os maiores de 12 anos, temos outras leis que podem amparar as vítimas expostas.
Fonte: AVA - SED/SC.

Unidade 3.3

Parte 4

O Marco Civil da Internet, que estabelece os direitos e os deveres para quem usa a rede, afirma no Artigo 21 que em casos de conteúdos de nudez e sexo não autorizados, a vítima pode solicitar remoção diretamente aos provedores de aplicações na Internet.
Comentário:
Se as fotos foram publicadas sem o consentimento, o Artigo 21 do Marco Civil da Internet permite que seja feita a solicitação de retirada do conteúdo das páginas na Internet. Se o autor da publicação invadiu algum dispositivo ou outros bens pessoais e roubou as fotos, há outra lei que pode ser acionada, a Lei 12.737 de 2012. Conhecida popularmente como Lei Carolina Dieckmann, trata da tipificação criminal de delitos informáticos.
O Código Penal Brasileiro foi atualizado em 2018 para, dentre outros pontos, fortalecer a punição aos que compartilham imagens íntimas sem autorização. A Lei nº 13.718/2018 deu uma nova redação ao Art. 218 do Código penal que passa a tipificar os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro, o que ajuda no combate aos crimes contra a liberdade sexual também no contexto das redes digitais.
“Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia"
Art. 218-C
Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.
Aumento de pena
§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.
Exclusão de ilicitude
§ 2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.Lei completa

Antes de seguirmos para o tutorial de como denunciar casos concretos de compartilhamento não consentido de imagens íntimas envolvendo crianças ou adolescentes, vamos refletir, na próxima Unidade, sobre o papel das escolas nas atividades de prevenção e mediação dos casos, retomando nossa abordagem sistêmica que inclui as etapas: PREVENIR - MEDIAR - REPORTAR E ACOMPANHAR.
Fonte: AVA - SED/SC.

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